Eretz Amazônia
A Selva nos Une
Por: Israel Blajberg
Manaus, junho de 2004. Uma rapida visita a encantadora Manaus é suficiente para avaliar a ponderavel densidade da contribuição judaica para o desenvolvimento da Amazonia. Aparentemente oculta pela selva, a presença judaica revela-se em toda a sua plenitude para um observador atento.
Basta andar pela cidade, ler as placas das lojas, as manchetes dos jornais.Bemol, Benzecry, nomes que soam familiares, e que sem duvida estao incorporados ao linguajar amazonense. Por toda a Amazonia. Em Macapa por exemplo, o Porto se chama Major Eliezer Levy (ex prefeito de Macapa). Nos confins do Acre, Guajara-Mirim, fronteira com a Bolivia, nomes judaicos sefaradim são comuns no comercio, na politica. Em Belem, Itacoatiara, Santarem, tantas e tantas cidades, onde houve e há sinagogas, cemiterios.
Um retrato na primeira página chama a atenção. Uma jovem lindissima, adornada por plumas amarelas. Ninguem menos que Geane Benoliel, a cunhã guerreira do Caprichoso. O nome e a expressao do seu rosto não deixa duvidas quanto a sua origem.
Admirando a sua figura maravilhosa, lembramos das profetizas da Biblia, da Rainha Esther, das nossas matriarcas… Não sabemos se ainda professa a Lei de Moises, ou se as suas origens se perderam na poeira dos tempos, como aconteceu com tantos e tantos da nossa gente … Uma coisa podemos garantir, não estava na sinagoga de Manaus naquele sabado pela manhan … onde fomos apreciar o shabat, e o tradicional kidush sefaradi marroquino que se seguiu, na bela sinagoga onde compareceram cerca de 50 correligionarios…
A materia define Geane como uma das mais fascinantes cunhãs da historia da festa bovina. Não se fala em outra coisa em Manaus a não ser a Festa do Boi de Parintins, onde 2 tradicionais agremiacoes competem entre si, o Boi Caprichoso, azul e branco (coincidencia ???), e o Boi Garantido, vermelho. Os maiores puxadores de toada do Boi são ninguem menos que os irmaos Assayag .. Ao longo do porto, embarcacoes anunciam vagas para a viagem. Parintins fica a 26 horas de barco de Manaus, pelas mesmas aguas navegadas por aqueles marroquinos sonhadores, que em 1810 deixaram o Marrocos sofrido em busca de um lugar onde pudessem gozar a desejada liberdade. Nesta jornada, chegaram ate Iquitos, no Peru, e levando junto a sua religiosidade, muito contribuiram para o progresso da Amazonia, primeiro como comerciantes e empreendedores, e mais tarde como profissionais liberais, empresarios, militares. Segundo o Prof. Samuel I. Benchimol, expoente da cultura amazonida, tantas vezes citado em palestras na Escola Superior de Guerra, haveriam no minimo 50 mil descendentes daqueles judeus marroquinos, numero este que poderia chegar a quase 300 mil, a imensa maioria infelizmente já afastada do judaismo.
Na semana em que estivemos em Manaus, tivemos a felicidade de asssitir ao comovente documentario Eretz Amazonia, que conta a saga daqueles pioneiros, cujos descendentes se espalham hoje por toda a Amazonia, a maioria já não mais praticando a religiao dos antepassados. Trata-se da resposta cabal e definitiva aos que propalam a inverdade de que os judeus são um grupo fechado, não se misturam … Nada mais longe da verdade, como podemos concluir pelo exemplo amazonico. No coquetel que se seguiu ao lancamento do filme, assistimos a 2 meninas tipicas representantes do caboclo amazonenese, que perguntavam timidamente a um dos diretores do CIAM – Centro Israelita do Amazonas como fazer para descobrir sua verdadeira origem.
A cena era ao mesmo tempo patetica e emocionante. O relato das praticas familiares, entre as quais se destacava o acendimento de velas nas sextas feiras a noite, sob a alegacao de que dava sorte, segundo a avó das meninas, trazia proteção para o lar… Mais uma vez funcionava o telegrafo invisivel de que falava Itzik Feffer, o poeta que Stalin mandou fuzilar, que interliga os corações judaicos distantes. Ali mesmo, onde outro telegrafo, este visivel, fora lancado pelo Marechal Rondon ao longo da selva fechada. Samuel Benchimol, Z”L (1923-2002), Professor e notavel estudioso da cultura amazonica, hoje da nome a um modernissimo predio da Universidade do Estado do Amazonas. Um pedestal na calçada identifica este predio, tao moderno que os alunos recebem via e-mail o que o professor escreve no quadro. Seu livro Eretz Amazonia é uma obra que deveria ser lido por todos os brasileiros, sejam ou não seguidores da Lei de Moises, a fim de que conhecam a importante contribuicao judaica para a Amazonia, quase desconehcida do grande publico.
Quem no Sul por exemplo conhece Isaac Sabbá, que construiu uma refinaria em Manaus, hoje a REMAN, da nossa Petrobras? Ou que um recente vice-governador do Amazonas exibia um nome judaico, e no mandato seguinte foi subtituido por alguem que exibia um nome libanes? Assim é o Brasil, assim é a Amazonia… Samuel Benchimol repousa eternamente numa sepultura destacada das demais, na ala judaica do cemiterio, a frente.
Não muito distante, podem se ver diversos tumulos judaicos ostentando a Estrela de David, perdidos em meio ao mar de cruzes, do cemiterio original. Inclusive o tumulo do Rabino Milagroso, Shalom Emanuel Muyal, nascido em 1910, repleto de plaquinhas agradecendo milagres supostamente concedidos, ali colocadas pela populacao em geral.
Portanto, a Amazonia exibe um elevado grau de miscigenacao entre caboclos, europeus, indios, e last but not least, com arabes e judeus. É preciso assistir ao filme para entender. Hoje Manaus transformou-se em uma metropole cercada pela selva. No moderno Amazonas Shopping, os frequentadores puderam apreciar durante alguns dias uma exposição patrocinada pela Embaixada de Israel. Jovens da comunidade orientavam os visitantes, como em qualquer parte do mundo.
A comunidade judaica em quase 200 anos firmou-se como parte indissoluvel da sociedade amazonense, com suas ricas tradições, e o tipico fervor religioso dos ortodoxos sefaradim, passado de pai para filho, do avo para o neto, como vemos na tocante cena inicial do filme. Não poderia terminar este texto sem uma referencia a Sua Eminencia Reverendissima, o Arcebispo Metropolitano de Manaus, Dom Luiz Soares Vieira. Este e um nome que deve ser lembrado por todos, especialmente pelas comunidades judaicas, em razao da sua especial sensibilidade, como vemos pelas suas sabias palavras.
As vesperas do Pessach de 2004, em sua coluna publicada nos principais jornais de Manaus, Dom Luiz escreveu que “… este povo tem a benção de D_us . a Pascoa Judaica reafirma o sentmento de Liberdade… como condição para viver como seres humanos dignos… a Presença de Javé, o D_us de Israel é Libertadora…” Em Manaus existe um importante Centro de Instrucao de Guerra na Selva – CIGS, reconhecido mundialmente nos meios militares. Quem vem do Sul para servir na Amazonia costuma ser homenageado com uma lembrança ao partir de volta, seja uma placa, seja um facao, onde vem gravada a inscrição: A SELVA NOS UNE Nada melhor para definir a relação entre aqueles judeus fervorosos que trocaram a terra natal sofrida do Marrocos pela Amazonia abençoada, mas que, ao contrario dos militares que vem do Sul, jamais partiram de volta, mas sim, ficaram para trabalhar e ajudar a defender a nossa Amazonia:
Eretz Amazônia – A Selva nos Une ! ! !
(*) Israel Blajberg – Eng. do BNDES – Rio de Janeiro, e Professor da Escola de Engenharia da UFF. Em 2004 encontra-se cursando a Escola Superior de Guerra.
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